EMAÚS
Deixe-me escrever esta carta
Enquanto é tempo.
Enquanto a chuva não vem .
Enquanto a Lua cresce,
e o silêncio da noite
é quebrado apenas
pelo murmúrio da Fábrica,
E o tic-tac do relógio.
Quando eu me encontrava preso
Numa prisão sem grades
De delírios e alucinações.
Quando o universo se acabava a cada dia.
E o tempo não tinha sentido.
Eu era como bêbado errante
Vaga nau de insensatos
Pedia pela morte
E ela não vinha.
E Ela não veio.
E esse tempo se foi.
Eu cresci e me tornei adulto na tortura.
E do delírio fiz um amigo...
Ainda as correntes me amarram
E os gritos podem ser ouvidos.
Ainda a delicada presença da loucura,
De tempos em tempos,
Abatendo-se em meus pensamentos.
Das trevas aqui narradas
Pouca coisa eu falo a ti.
Esse é meu Mundo
Ninguém nele entra
Pois quando entra perde sua própria vida,
é a morte da alma.
Eu cuido dele
Guardo para que não se quebre.
Sorrio, assisto, ando, falo.
Penso e resisto
Dialogo com Cristo.
Estive em muitas batalhas
Vi corpos despedaçarem-se
Em minha frente.
Estive em terras distantes.
Outros planetas, sistemas...
Fiz revoluções.
Tomei o poder,
-abdiquei.
Não tinha nada no espaço de meu ser,
Que pudesse ser chamada amizade.
Não tinha cachorro, gato
Olhar feliz
Não tinha medo,
Tinha pavor.
O ódio aquecido
Guardado e triturado nas entranhas da alma
Vomitava na minha pele.
E o cheiro de náusea era um gosto de
Enfim...
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Então hoje tenho o Sol
E a bandeira do Divino
Hoje a memória guarda
A passagem do tempo.
Não como ferida.
Cicatriz...
Marca profunda na pele
No cabelo de neve
No branco da barriga.
Na pupila distraída
Ao longe
Longe...
Como um véu
Sobre o saber,
E o esquecimento.
Quando ainda oro no quarto escuro
E a vela, ao acender-se,
Luta contra a morte
Até quase se apagar.
E a chama vence e festeja o calor.
Penso no nosso domínio,
Naquele que um dia será um lar.
Emaús.
Não de um
Nem de dois.
De centenas
Ou milhões...
Daqueles que pedirem
Abrigo Amigo
Daqueles que sofreram
E buscaram perguntar:
Para que somos?
Porque nos tornarmos seres sofridos,
Sofredores na mente
Na ansiedade última,
Na angústia
De querer saber,
E conhecer,
O que é proibido.
Senhor!
Dizem eles.
Dá-nos Abrigo
Amigo.
Morada,
Sagrada!
Para curar nossas chagas abertas,
Da ilusão e do Terror.
Dá-nos a esperança da criança!
Há tens de sobra sabemos.
Pois dizem que fizeste,
Este caminho há anos...
E tiraste a conclusão sobre o teu estado.
Não Senhor,
Não nos abandones!
Sejamos nós os que acenderão as velas,
Dirigirão as preces
E escolherão as flores.
Sejamos nós aqueles
Que Ele te indicou
Para curar.
Como Francisco aos leprosos
E Thereza aos indianos.
Eu ouço isto e vejo.
Uma pedra na entrada,
Alta como dois homens
E uma oração escrita nela
Gravada assim:
Abençoado sejam
Os que buscam,
Porque encontrarão.
Felizes os que sonham,
Porque terão o futuro.
Meu pão é teu pão
Meu corpo é teu corpo
Meu amor é o amor
De ti ao Pai.
Mondaí , 29 de Outubro de 1998
Intrigante...
ResponderExcluirDá pra sentir...
Triste...
Gostei de conhecer!
Abraços,
Carine.